
A brasileira Marliene de Jesus Neves está presa cauterlamente há nove meses na Macedônia do Norte, cumprindo pena de cinco anos e seis meses de prisão, após um processo que, segundo a defesa, apresenta graves irregularidades e violações de direitos humanos. Até o momento, Marliene não recebeu visita consular brasileira.
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Condenada por “recrutamento e intermediação de prostituição”, Marliene sustenta que sua atividade era estritamente administrativa, em trabalho registrado em Portugal, país em que residiu por anos.
“Eu apenas atendia telefones, organizava agendas e cuidava de redes sociais. Nunca explorei mulheres ou recrutei pois todas eram amigas de longa data ou indicação de outras da qual prestei o mesmo serviço, eu tentei protegê-las”, afirmou em carta enviada à imprensa.
A brasileira relata que entrou em conflito com um grupo criminoso albanês, ativo há mais de sete anos na região dos Bálcãs, envolvido em prostituição ilegal, violência sexual e patrimonial. “Três meses após enfrentá-los, fui presa. As provas que apresentei sobre eles foram ignoradas”, denuncia Marliene.
Agora, a situação se agravou: Marliene afirma que vem recebendo ameaças diretas desse grupo criminoso, caso seja transferida para o presídio destinado ao cumprimento de sua pena. Segundo a defesa, existem registros em vídeo e prints nos quais membros armados do grupo fazem ameaças à sua vida, o que reforça o risco iminente de violência contra a brasileira.
O advogado Gustavo Corrêia (OAB/SC 55.585) destaca que a condenação também envolveu envio de dinheiro ao Brasil e a Portugal, quantias destinadas ao sustento de familiares. “Do ponto de vista jurídico, ainda que se considerasse ilícita a origem dos valores, a conduta é atípica em relação à lavagem de dinheiro, pois não houve ocultação ou dissimulação de recursos. No máximo, poderia ser discutida a hipótese de evasão de divisas. Transformar o envio de ajuda familiar em ‘lavagem’ é um erro técnico grave”, ressalta.
O caso de Marliene se soma a outros de brasileiras presas no exterior em condições questionáveis, como os episódios noticiados de mulheres detidas na Ásia e na Europa, posteriormente reconhecidas como vítimas de processos falhos e violações de garantias fundamentais. Em comum, observa a defesa, estão acusações desproporcionais, ausência de contraditório efetivo e uso de réus vulneráveis como exemplos políticos.
Marliene afirma que foi pressionada a admitir parte das acusações, sem provas concretas e com acesso restrito de seus advogados ao processo. “Fui coagida a me declarar culpada para não receber uma pena ainda mais pesada. Nunca tive direito a uma defesa plena”, declarou.
A brasileira é ré primária, mãe de um filho menor e sem antecedentes criminais. Ainda assim, teve negado o pedido de prisão domiciliar, mesmo após a apreensão de seu passaporte e a comprovação de residência fixa. Seu filho, inicialmente presente no país no momento da detenção com ela, só foi entregue à família no Brasil após intervenção de órgãos de proteção.
No sistema prisional, Marliene relata recusa de medicamentos controlados, ausência de acompanhamento médico, intimidações de agentes e ameaças de transferência para o mesmo presídio onde estão integrantes do grupo criminoso com quem teve desavenças.
“Não me coloco como vítima absoluta. Reconheço meus erros, mas não sou criminosa de alta periculosidade. Estou sendo usada como bode expiatório”, desabafa.
Para Gustavo Corrêia, o caso ultrapassa a esfera penal e atinge os direitos humanos mais básicos: “Estamos diante de uma cidadã brasileira submetida a um processo sem devido contraditório, sem acesso a provas e sem garantias fundamentais. Trata-se de violação clara das normas internacionais de proteção aos direitos humanos, especialmente da Convenção de Viena sobre Relações Consulares, que assegura visita e acompanhamento consular a presos estrangeiros”.
O processo de transferência de Marliene para o Brasil foi iniciado em 13/08. A defesa pede apoio das autoridades brasileiras, da imprensa e de organizações internacionais de direitos humanos, para que o caso seja acompanhado de forma transparente e que sejam asseguradas condições humanitárias a Marliene.